quinta-feira, 18 de agosto de 2016

CRISTIANISMO (Parte 6 - Decadência da Idade Média)

Formação de Estados na Europa

A Baixa Idade Média representa o período determinante na formação dos estados ocidentais europeus. Os reinos de França, Inglaterra e Espanha consolidam o seu poder e definem centros de poder duradouros. Surgem também novas potências na Europa Central como a Hungria e Polônia, após sua conversão ao cristianismo.

O Reino da Hungria teve origem nos Magiares, que se estabeleceram no território por volta do ano 900 durante o reinado de Árpád, depois do período de conquista do século IX.

O papado, que até então sempre se manifestara independente dos reis seculares, começa a afirmar a sua autoridade temporal sobre a totalidade do mundo cristão. A monarquia papal atinge o seu apogeu durante o início do século XIII durante o pontificado do Papa Inocêncio III.

As Cruzadas do Norte e o avanço dos reinos cristãos e ordens militares para regiões pagãs no Báltico e no norte da Escandinávia levou à assimilação forçada de inúmeros povos autóctones na Europa.

Durante o início da Baixa Idade Média, a Alemanha foi dominada pela dinastia saxônica, que lutava ainda pelo controlo dos poderosos ducados locais formados durante as migrações bárbaras dos séculos anteriores. Em 1024, assume o poder a dinastia saliana, que tinha já entrado em confronto aberto com o papado acerca de nomeações eclesiásticas durante o reinado do imperador Henrique IV. 

Os seus sucessores continuaram o clima de confronto, estendendo-o a parte da nobreza germânica. Depois da morte do imperador Henrique V, o qual não havia deixado descendência, seguiu-se um período de instabilidade até ao reinado de Frederico I, que toma posse do trono imperial durante o fim do século XII.

Embora o seu reinado tenha sido estável, os seus sucessores enfrentam o mesmo clima de instabilidade ainda durante o século XIII.153 Um dos fatores de maior instabilidade foi a constante ameaça e invasão dos Mongóis no território europeu em meados do século XIII, desde as primeiras incursões no Principado de Kiev até às invasões da Europa de Leste em 1241, 1259 e 1287.

Dominada pela dinastia capetiana, a corte francesa aumenta gradualmente a sua influência sobre a nobreza, permitindo-lhe exercer maior controlo nos territórios para além da Ilha de França do que durante os séculos XI e XII.

No entanto, encontrariam resistência por parte dos Duques da Normandia, que em 1066 tinham já subjugado grande parte de Inglaterra e criado um império em ambas as margens do canal que duraria até ao fim da Idade Média

Durante a dinastia Plantageneta do rei Henrique II e dos seus sucessores, o reino dominaria a totalidade de Inglaterra e grande parte de França.158 No entanto, viria a perder a Normandia e a maior parte das possessões do Norte de França durante o reinado de João em 1204.

Isto esteve na origem de divergências entre a nobreza Inglesa, ao mesmo tempo que as obrigações financeiras decorrentes da tentativa de reconquista da Normandia obrigaram o rei a assinar em 1215 a Magna Carta, um documento que limitaria o poder absoluto do rei e foi o primeiro passo de um longo processo que levaria ao parlamentarismo.

Durante o reinado de Henrique III, foram feitas ainda mais concessões de poder à nobreza e diminuído o poder da corte. A monarquia francesa, no entanto, continuaria a fortalecer a sua influência perante a nobreza durante o século XIII, centralizando a administração e aumentando o número de territórios que diretamente controlava.

Além da sua expansão para Inglaterra, os Normandos chegaram a estabelecer colônias na Sicília e no sul de Itália, depois de Roberto de Altavila ter desembarcado no território em 1509 e estabelecido um ducado que mais tarde se tornaria o Reino da Sicília.

Na península Ibérica, os estados cristãos confinados à região noroeste do território iniciam o processo de Reconquista dos estados islâmicos no sul. Por volta de 1150, o norte cristão estava dividido em cinco reinos principais – Leão, Castela,Aragão, Navarra e Portugal.

O sul da península continuava dominado pelos estados islâmicos, inicialmente pelo Califado de Córdoba, que, no entanto, se viria a fragmentar em 1031 numa série de pequenos estados voláteis denominados taifas, que continuaram a combater os reinos cristãos até o Califado Almóada restabelecer o governo central no sul durante a década de 1170.

As forças cristãs fazem novos avanços durante o início do século XIII, culminando na captura de Sevilha em 1248.

Cruzadas 


O Krak des Chevaliers, uma fortaleza construída durante as Cruzadas para a Ordem dos Cavaleiros Hospitalários166

Durante o século XI, a dinastia seljúcida viria a dominar grande parte do Médio Oriente, conquistando os antigos territórios persas na década de 1040, a Armênia na década de 1060, e a cidade de Jerusalém em 1070. Em 1071, o exército turco derrotou o exército bizantino durante a batalha de Manziquerta, capturando o imperador bizantino Romano IV Diógenes.

Isto possibilitou aos Turcos a invasão da Ásia Menor, o que constituiu um golpe severo no Império Bizantino ao retirar-lhe grande parte da população e o seu centro econômico.

Embora o exército bizantino se tenha reorganizado, nunca chegaria a recuperar a Ásia Menor e só efetuaria ações defensivas. Os próprios Turcos vieram a enfrentar dificuldades na manutenção do território, perdendo o domínio de Jerusalém para o Califado Fatímida do Egito e assistindo ao despoletar de várias guerras civis no seu interior.

O percurso dos exércitos cruzados em direção ao Levante
As Cruzadas pretendiam libertar Jerusalém do domínio muçulmano. A primeira Cruzada foi promovida pelo Papa Urbano II durante o Concílio de Clermont, em 1095, como resposta a um pedido de ajuda do imperador bizantino Aleixo I, Comneno,  para conter o avanço muçulmano na região.

O papa prometeu indulgências a todos os que tomassem parte, tendo sido mobilizadas milhares de pessoas na Europa, de todas as classes sociais. Jerusalém foi conquistada pelos cruzados em 1099, tendo também sido estabelecidos vários estados cruzados na região.

Durante os séculos XII e XIII, houve uma série de conflitos entre estes estados e os territórios islâmicos circundantes, o que levou à convocação de novas cruzadas em seu auxílio, ou para reconquistar Jerusalém, que entretanto tinha sido novamente capturada por Saladino em 1187.

As ordens religiosas militares, como os Templários ou os Hospitalários, são formadas durante esta época, e viriam a desempenhar um papel fundamental na consolidação e estabilização dos territórios reconquistados.

No ano de 1204, a Quarta Cruzada conquista a cidade de Constantinopla estabelecendo o que viria a ser o Império Latino de Constantinopla e enfraquecendo consideravelmente a posição do Império Bizantino que, embora voltasse a conquistar Constantinopla em 1261, nunca chegaria a restabelecer a glória dos séculos anteriores. No entanto, em 1291 todos os estados cruzados tinham já sido capturados ou forçados a deslocar-se para territórios insulares.

O poder papal convocou também cruzadas para outras regiões além da Palestina, tendo sido proclamadas para a península Ibérica, sul de França e ao longo do Báltico.

As cruzadas na península Ibérica estão interligadas com o processo de Reconquista do território aos muçulmanos. A participação da Ordem dos Templários e da Ordem dos Hospitalários serviu como modelo para a fundação de várias ordens militares locais, a maior parte delas mais tarde integradas nas duas ordens que viriam a ser dominantes no início do século XII, a Ordem de Calatrava e de Santiago.

A Europa do Norte, que tinha permanecido fora da influência do mundo cristão até ao século XI, foi também palco de movimentos de conquista entre os séculos XII e XIV que viriam a ser conhecidos como Cruzadas do Norte. Este movimento deu também origem a várias ordens militares, entre elas os Irmãos Livônios da Espada e a Ordem dos Cavaleiros Teutônicos.

Esta última, apesar de fundada nos estados cruzados, foi, sobretudo, ativa na área do Báltico a partir de 1225, mudando em 1309 a sua sede para o Castelo de Malbork na Prússia.

Arquitetura e arte



 Pantocrator. Afresco românico da autoria do Mestre de Taüll, atualmente no Museu Nacional de Arte da Catalunha

Ao longo do século X, a edificação de igrejas e mosteiros é feita, sobretudo, através da mimetização e aperfeiçoamento dos modelos estéticos vernaculares romanos, o que estaria na origem da designação românica.

As próprias construções romanas eram muitas vezes demolidas e recicladas, aproveitando-se o material disponível e integrando-se métodos e motivos ornamentais antigos nas novas construções. 

A partir das primeiras experiências durante o que se convencionou designar por arte pré-românica, o estilo desenvolveu-se e propagou-se pela Europa de forma notavelmente homogênea, motivado por um surto sem precedentes em nível de construção de novos espaços religiosos.

Praticamente todos estes espaços foram decorados com pinturas murais, embora hoje em dia sejam muitíssimo poucos os exemplos sobreviventes. Entre as características mais distintivas do românico conta-se os paramentos de grande espessura, o uso do arco de volta perfeita, aberturas de pequena dimensão, e o uso de arcaria cega nas paredes.

Os grandes portais profusamente decorados com escultura e alto-relevos, quase sempre pintados, tornam-se um dos elementos centrais das fachadas, sobretudo em França. Os capitéis são na sua maioria decorados com motivos animalistas e figuras de bestiário. Desenvolve-se também a forma característica da fortaleza Europeia, crucial para a política e guerra.

A partir do início do século XII, desenvolve-se em França a arquitetura gótica, distinta, sobretudo, pelo recurso a abóbadas de cruzaria, arcos quebrados, arcobotantes e aberturas de maiores dimensões, preenchidas com vitrais.

O gótico permaneceu uma opção estética comum até ao século XVI em grande parte da Europa, e está presente, sobretudo, em igrejas e catedrais de grandes dimensões, como a Catedral de Chartres ou a Catedral de Reims.

Igreja e sociedade 



São Francisco de Assis, fundador da Ordem Franciscana, aqui representado por Bonaventura Berlinghieri (1235)

A reforma monástica é um tema central ao longo do século XI, à medida que cresce a inquietação entre a elite da Igreja relativamente ao fato dos monges não aderirem por completo a uma forma de vida estritamente religiosa, ao poder excessivo detido por bispos locais e à diversidade de cultos existente de região para região.

A Abadia de Cluny, fundada em 909, dá origem a um amplo movimento de reforma monástica, chegando a unir na sua ordem, no seu apogeu, mais de um milhar de mosteiros na Europa. A ordem obtém reputação de austeridade, rigor e de independência econômica e política em relação aos poderes locais, ao não permitir a interferência e participação de leigos nas suas eleições e colocando-se a si própria sobre proteção do papado.

A reforma monástica de Cluny inspirou mudanças na própria hierarquia da Igreja. Os seus princípios foram adotados durante o papado do próprio Papa Leão IX, e contribuíram para a ideologia independentista que levaria à controvérsia das investiduras no fim do século XI.

A controvérsia envolveu o Papa Gregório VII e o Imperador Henrique IV, inicialmente sobre nomeações episcopais, mas que se tornou numa disputa acesa sobre questões de investidura, matrimônio dentro do clero e simonia.

O imperador, que via como obrigação a proteção da Igreja, pretendia escolher os próprios bispos no seu território, enquanto que o papado insistia na sua independência face ao poder secular.

A questão permaneceu por resolver mesmo depois da Concordata de Worms, em 1122. O conflito é um dos mais significativos episódios que esteve na base da criação de uma monarquia papal independente e equivalente às autoridades leigas.

A Baixa Idade Média foi também palco para inúmeros movimentos religiosos. Para além dos cruzados e dos reformadores monásticos, a vida religiosa abriu-se a novas formas de organização. Foram fundadas novas ordens monásticas, como a Ordem dos Cartuxos ou a Cisterciense, esta última expandindo-se rapidamente sob a liderança de Bernardo de Claraval, e novas ordens militares como a Ordem dos Templários.

Muitas destas ordens são fundadas como resposta ao sentimento generalizado que o monaquismo Beneditino estava já desajustado das necessidades dos leigos, sobretudo dos que pretendiam uma comunidade monástica próxima do modelo hermético e fechado paleocristão ou viver de forma apostólica. A peregrinação religiosa era também encorajada.

Os antigos locais de peregrinação, como Roma, Jerusalém e Santiago de Compostela, acolhiam um número cada vez maior de peregrinos, ao mesmo tempo que novos locais ganham destaque, como Monte Gargano e a Basílica de San Nicola.

Durante o século XIII, o papado aprova as ordens mendicantes dos dominicanos e franciscanos, cujos membros fazem juras de pobreza e de mendicidade como única fonte de rendimento. Para além das ordens reconhecidas oficialmente, surgem ao longo dos séculos XII e XIII vários outros grupos como os valdenses ou os cátaros, embora tenham sido decretados hereges pelo papa. Os cátaros chegaram mesmo a ser o alvo da Cruzada Albigense e extintos durante a inquisição medieval.

Os séculos XIV E XV(Baixa Idade Média)


Doentes de Peste negra. Iluminura. (c.1272-1352). 

Os primeiros anos do século XIV são marcados por várias carestias, que culminariam na Grande fome de 1315-1317. Para além da transição climática abrupta do período quente medieval para a pequena Idade do Gelo, as várias carestias são o resultado de uma especialização excessiva em mono culturas, que deixaram a população vulnerável às devastações causadas por condições meteorológicas desfavoráveis.

No seguimento destas catástrofes, surge em 1347 a Peste Negra, uma epidemia altamente contagiosa e mortal que se disseminou por toda a Europa entre 1348 e 1350. A cifra de mortes é estimada em 35 milhões de pessoas, cerca de um terço da população, e atingiu sobretudo as cidades em virtude da elevada concentração populacional. 

Grandes porções do território ficaram inabitadas e os terrenos abandonados. Em função da escassez de mão de obra, o preço dos salários na agricultura subiu significativamente, o que, no entanto, seria contrabalançado pela queda abrupta da procura de gêneros alimentares. 

A luta por salários iguais por parte dos trabalhadores urbanos esteve na origem de uma série de revoltas populares por toda a Europa, entre elas a Jacquerie na França, a revolta de 1381 em Inglaterra, e várias revoltas nas cidades de Florença, na atual Itália, e Gent e Bruges, ambas localizadas na atual Bélgica. 

O trauma infligido pela peste provocou um fervor religioso por toda a Europa, que se manifestaria na fundação de novas caridades, na culpabilização extrema dos flagelantes e na acusação dos Judeus como bodes expiatórios. A peste regressaria, ainda que esporadicamente e em surtos menores, ao longo de todo o século XIV.

O renascer do Estado 

A Baixa Idade Média também testemunhou a ascensão por toda a Europa de Estados-nação monárquicos fortes, particularmente na Inglaterra, França e nos reinos cristãos da península Ibérica — Aragão, Castela e Portugal. Os longos conflitos do final da Idade Média vieram fortalecer o domínio real sobre o próprio território, ainda que tenham sido extremamente pesarosos com os camponeses.

Os reis obtinham benefícios com os conflitos através do aumento territorial e da extensão da legislação real por todos os seus reinos. O financiamento da guerra exigiu métodos de cobrança de impostos e, na maior parte das vezes, aumentos significativos na taxa de impostos.

A necessidade de obter o consentimento daqueles que eram taxados levou a que corpos representativos, como o Parlamento da Inglaterra ou a Assembleia dos Estados Gerais, ganhassem algum poder e autoridade.



Joana d'Arc numa ilustração do século XV

Ao longo do século XIV, a monarquia francesa procurou alargar a sua influência por todo o reino, sacrificando as possessões da nobreza. ,Esta expansão foi alvo de resistência quando tentou confiscar as possessões da coroa inglesa no sul de França, o que levou à deflagração da Guerra dos Cem Anos, que se prolongaria até 1453.

O próprio reino francês esteve na iminência da desagregação durante os primeiros anos do conflito devido ao esforço de guerra, situação que se voltaria a repetir durante os primeiros anos do século XV e apenas invertida no fim da década de 1420, com as sucessivas vitórias militares de Joana d'Arc e a vitória final do reino francês ao capturar a última colônia inglesa no sul de França em 1453.

No entanto, estima-se que a população francesa no final do conflito tinha diminuído para metade. Paradoxalmente, a guerra viria a contribuir significativamente na formação da identidade nacional inglesa, proporcionando a união de várias identidades locais numa identidade cultural única e distinta da influência cultural francesa dominante até ao início da Guerra dos Cem Anos.

A guerra marcou também a introdução de nova tecnologia de combate, como o arco longo e do canhão de combate na batalha de Crécy em 1346.

Apesar de o Sacro Império Romano-Germânico continuar a existir, a natureza eletiva da coroa imperial impediu a formação de qualquer dinastia estável capaz de manter um estado forte.

Mais a leste, os reinos da Polônia, Hungria e Boêmia ganharam poder e influência. Na península Ibérica, continuava o processo de reconquista dos reinos muçulmanos do sul, embora Portugal se tenha concentrado ao longo do século XV na expansão ultramarina, enquanto os restantes reinos lidavam com problemas sucessórios e instabilidade social no mesmo período.

A Inglaterra, após a derrota na Guerra dos Cem Anos, entraria num longo período de guerra civil conhecido como Guerra das Rosas, que duraria até ao fim da década de 1490 e que só terminou após a vitória de Henrique VII sobre Ricardo III na batalha de Bosworth Field em 1485.

Os reinos escandinavos da Noruega, Dinamarca e Suécia foram brevemente unificados durante a União de Kalmar, no final do século XV e nas primeiras décadas do século XVI, mas voltariam a desagregar-se depois da morte da rainha Margarida I. 

As maiores potências do mar Báltico continuavam a ser as cidades-Estado da Liga Hanseática. cujas rotas comerciais se estendiam da Europa Ocidental até à Rússia. A Escócia, liderada por Roberto I, viu reconhecida pelo papa a sua independência do domínio Inglês em 1328.

Colapso de Bizâncio 

Embora os imperadores paleólogos tivessem conseguido recapturar Constantinopla, em 1261, nunca conseguiram recuperar o domínio sobre as antigas terras do Império Bizantino. Controlavam apenas uma pequena parte da península Balcânica perto de Constantinopla, a própria cidade, e algumas terras costeiras no mar Negro e no mar Egeu.

As antigas terras bizantinas nos Balcãs foram divididas entre o Reino da Sérvia, o Império Búlgaro e a República de Veneza. O poder imperial bizantino seria ameaçado por uma nova tribo oriunda da Ásia, os Otomanos, que tinham ocupado a Anatólia durante século XIII, expandindo-se progressivamente ao longo do século XIV. 

Em 1366, subjugam a Bulgária à vassalagem e conquistam a Sérvia após a derrota desta na batalha do Kosovo, em 1389. Os reinos ocidentais reuniram-se em auxílio dos cristãos balcânicos e declararam uma nova cruzada, em 1396, enviando um numeroso exército, que viria no entanto a ser derrotado na batalha de Nicópolis. Constantinopla acabaria por ser finalmente capturada pelos Otomanos em 1453.

Controvérsia dentro da Igreja 

Uma das mais significativas manifestações da instabilidade do século XIV foi o Papado de Avinhão, de 1305 a 1378, e o Grande Cisma do Ocidente que se lhe seguiu, entre 1378 e 1418, momento em que coexistiram dois, e depois três, papas rivais, cada um apoiado por estados diferentes.

No início do século XV, depois de um século de instabilidade, os oficiais eclesiásticos reuniram-se no Concílio de Constança, em 1414, depondo no ano seguinte um dos papas rivais, deixando apenas dois pretendentes. Seguiram-se várias deposições até que, em novembro de 1417, o concílio elege Martinho V (1417–1431).

Além do cisma, a Igreja ocidental estava divida por controvérsias teológicas, algumas das quais viriam a ser consideradas heresias. John Wyclif (m. 1384), um teólogo inglês, foi condenado por heresia, em 1415, por defender o acesso dos laicos ao texto da Bíblia e por assumir posições sobre a Eucaristia contrárias à doutrina da Igreja. 

Os ensinamentos de Wyclif influenciaram os dois maiores movimentos hereges da Idade Média – o Lollardismo na Inglaterra e os Hussitas na Boêmia. Os boêmios foram também influenciados por Jan Huss, sentenciado à fogueira em 1415 depois de ter sido condenado como herege pelo Concílio de Constança. 

A Igreja hussita, embora sujeita a uma cruzada contra si, sobreviveria até ao fim da Idade Média. Entre outras heresias criadas estão também às acusações contra a Ordem dos Templários, que estiveram na origem da sua supressão em 1312 e da divisão do seu vasto espólio entre Filipe IV de França e os Hospitalários.

O papado refinou o conceito de transubstanciação durante o fim da Idade Média, afirmando que apenas o clero regular podia partilhar o vinho da Eucaristia. Isto viria a distanciar ainda mais o clero secular do clero regular. Os leigos mantiveram as práticas de peregrinação, veneração de relíquias e a crença no poder do Diabo. 

Místicos como Mestre Eckhart (m. 1327) ou Thomas à Kempis (m. 1471) foram autores de obras que ensinavam aos leigos a focarem-se na sua própria espiritualidade, uma interpretação que viria a contribuir para a Reforma Protestante.

A crença em bruxaria generalizou-se de tal forma que, no fim do século XV, a Igreja cedeu à pressão do medo e da paranoia populista, iniciando em 1484 uma série de julgamentos pela prática de bruxaria, sendo também publicado em 1486 o Malleus Maleficarum, o mais popular manual de caçadores de bruxas.

Acadêmicos, intelectuais e descobrimentos 



Reunião de doutorados na Universidade de Paris

John Duns Scotus  (n.1308) e Guilherme de Ockham (n. circa 1348), lideraram uma das mais notáveis reações contra a escolástica medieval, rejeitando a aplicação da razão na fé. Os seus esforços, aliados aos de vários outros autores, levariam à renúncia do ideal platônico do "universal". 

A persistência de Ockham em que a razão opera de forma independente da fé permitiu à ciência separar-se em definitivo da teologia e filosofia. O Direito pautou-se pelo avanço sólido do direito romano em áreas de jurisprudência anteriormente governadas pelo direito consuetudinário.

A única exceção foi a Inglaterra onde prevaleceu o direito comum. Vários países fizeram um esforço no sentido de codificar as leis, tendo sido promulgados códigos jurídicos em estados tão diversos como Castela, Polônia e Lituânia.

A educação permanecia ainda direcionada ao futuro clero. A aprendizagem básica de letras e aritmética podia ser feita na própria província da família ou através do clero local, mas os assuntos secundários do trivium — gramática, retórica e lógica — eram estudados nas escolas catedrais presentes nas grandes cidades. 

Difundiram-se também as escolas comerciais, chegando algumas cidades de Itália a ter mais do que um destes empreendimentos. Durante os séculos XIV e XV apareceram também uma série de novas universidades por toda a Europa. 

Surgem grandes autores da literatura vernacular, como Dante, Petrarca e Giovanni Boccaccio na Itália do quattrocento, Geoffrey Chaucer e William Langland na Inglaterra e Cristina de Pisano, na França.

A literatura continuou a ser sobretudo de natureza religiosa, mas embora muitas destas obras continuassem a ser escritas em latim, aumentou a procura de textos que se debruçassem sobre santos e outros temas religiosos em línguas vernaculares. 

No teatro, surge o gênero de peças miraculosas patrocinadas pela Igreja. A invenção da prensa móvel por volta de 1450, trouxe consigo a democratização e facilidade na impressão de livros, e deu origem a inúmeras editoras em toda a Europa.

A percentagem de alfabetizados cresceu, embora continuasse baixa; as estimativas apontam para que por volta de 1500 a taxa de literacia fosse de apenas 10 % entre os Homens e 1 % entre as mulheres.

Durante o início do século XV, os reinos da península Ibérica começaram a financiar explorações além das fronteiras da Europa. O Infante D. Henrique de Portugal (m.1460) foi o impulsionador de expedições que viriam a descobrir as Ilhas Canárias, Açores e Cabo Verde ainda durante a sua vida.

Em 1486, Bartolomeu Dias (m.1500) navegou ao longo da costa ocidental africana até ao cabo da Boa Esperança, ponto de difícil passagem que seria superado em 1498 por Vasco da Gama (m.1524), abrindo assim a rota marítima para a Índia.

Os reinos de Aragão e Castela financiaram a viagem expedicionária de Cristóvão Colombo (m. 1506) que em 1492 viria a descobrir a América. A coroa inglesa, na figura do rei Henrique VII (r. 1485–1509) financiou a viagem de Giovanni Caboto (m. 1498), que em 1497 chegaria à ilha de Cape Breton.

Progressos tecnológicos 
O uso crescente de ovelhas com lã de fibras longas permitiu a obtenção de fio com maior resistência. As rocas de fiar tradicionais foram progressivamente substituídas por rodas de fiar, triplicando a sua capacidade produtiva.

Um dos avanços técnicos com maior impacto na vida quotidiana foi a introdução de botões para fechar as peças de roupa, permitindo a criação de peças com corte adequado sem a necessidade de as atar.

Os moinhos de vento foram melhorados com a implementação de torres giratórias em função da direção do vento. O alto-forno aparece na Suécia por volta da década de 1350, melhorando a qualidade do ferro e aumentando a capacidade de produção. A primeira lei de patentes, criada em Veneza no ano de 1447, passou a proteger os direitos dos inventores.

Arquitetura e arte no século XV



Ilustração do livro de horas Les très riches heures du duc de Berry, século XV

A arte do fim do período medieval na generalidade da Europa contrasta com a arte italiana do mesmo período. Enquanto que em Itália o contexto artístico mostrava já sinais de que se preparava o Renascimento, no norte da Europa e na península Ibérica manteve-se o gosto e a preferência pela estética gótica praticamente até o fim do século XV, culminando na exuberância e complexidade características do gótico internacional.

A encomenda de arte secular aumentou significativamente em quantidade e qualidade, muito impulsionada pelo patronato das classes mercadoras da Itália e Flandres, fazendo encomendas de retratos de si próprios em óleo e comprando imensa joalharia, cofres, arcas e majólica. 

Entre os objetos muito apreciados e encomendados encontrava-se também a cerâmica mourisca produzida pelos ceramistas mudéjares em Espanha. Embora entre a realeza prevalecesse o gosto por peças de prata, são poucos os exemplares que sobreviveram até aos nossos dias, como a Taça de Santa Inês.

O desenvolvimento da manufatura de seda em Itália veio tornar a Europa menos dependente das importações de Bizâncio ou do mundo islâmico. Na França e na Flandres, os conjuntos de tapeçaria como a A Dama e o Unicórnio tornar-se-iam num dos mais cobiçados objetos de luxo.

As complexas gramáticas decorativas do alto gótico, até aí visíveis sobretudo no exterior dos templos, são progressivamente adaptadas a vários elementos do interior, sobretudo em túmulos e púlpitos, como o Púlpito de Santa Andreia em Pistoia.

Os retábulos pintados ou de madeira entalhada tornam-se comuns, sobretudo à medida que se começa a criar capelas laterais nas igrejas. A própria pintura flamenga dos séculos XV e XVI, através de artistas como Jan van Eyck (m. 1441) ou Rogier van der Weyden (m. 1464), rivaliza em qualidade com o próprio quattrocento italiano. 

Os manuscritos iluminados e os livros de temática secular, sobretudo,contos, começam a ser colecionados em larga escala pela elite no século XV. A partir de 1450 e ainda que caros, os livros impressos tornam-se extraordinariamente populares, havendo já cerca de 30.000 incunábulos impressos no ano 1500.

A impressão tornou também obsoleta a iluminura, fazendo destas obras, no século XVI, um objeto com valor meramente artístico e encomendado apenas pela elite. Embora as pequenas xilogravuras, quase sempre de temas religiosos, fossem acessíveis até a camponeses, as gravuras eram mais caras e destinadas a um mercado mais abastado.


Ilustração medieval de uma terra redonda, cópia do século XIV de L'Image du monde

O período medieval é frequentemente caricaturado enquanto "tempo de ignorância e superstição", que "sobrepunha sempre os mandamentos religiosos em relação à experiência pessoal e racionalismo."

Esta noção é um legado da Renascença e do Iluminismo, períodos em que os intelectuais estabeleciam sempre a comparação da sua cultura com a cultura medieval de forma preconceituosa.

Os intelectuais renascentistas viam a civilização clássica como uma época de imensa cultura e civilização, e a Idade Média como um progressivo declínio dessa cultura. Por seu lado, os iluministas encaravam a razão como sendo sempre superior à fé e, por conseguinte, a Idade Média como um tempo de ignorância e superstição.

Uma corrente de pensamento defende, no entanto, que a razão e a lógica era normalmente tida em conta durante a Idade Média. O historiador da ciência Edward Grant, escreveu que "o fato de o raciocínio lógico ter sido expresso no século XVIII , só pode ter sido possível devido à longa tradição medieval que definiu o uso da razão como a mais importante das atividades humanas". 

Também, ao contrário do que é comum acreditar-se, David Lindberg escreve que "o intelectual medieval raramente era pressionado pela força coercitiva da Igreja e muito provavelmente considerava-se livre (sobretudo na ciência natural) para seguir a razão e observação até onde quer que isso os conduzisse".

A caricatura do período reflete-se também em várias crenças populares. Por exemplo, uma das especulações que começou a ser difundida durante o século XIX e que ainda é muito comum na cultura popular, é a suposição, errada, de que todas as pessoas na Idade Média acreditavam no mito da Terra plana.

Na verdade, o próprio corpo das universidades medievais propunha evidências que demonstravam que a Terra seria esférica, Lindberg e Numbers afirmam mesmo que seria muito rara a existência de qualquer acadêmico cristão medieval que não tivesse conhecimento da esfericidade da Terra ou que não soubesse até a sua circunferência aproximada.

Entre outros equívocos comuns sobre o período medieval está a noção de que "a Igreja proibia as autópsias e a dissecação" ou que "o avanço do Cristianismo impediu o progresso da ciência", mitos populares que ainda são vistos como verdades históricas apesar de não serem apoiados pela historiografia contemporânea. 

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